terça-feira, 19 de maio de 2009
Fala a sério e fala no gozo
Fá-la pela calada e fala claro
Fala deveras saboroso
Fala barato e fala caro
Fala ao ouvido fala ao coração
Falinhas mansas ou palavrão
Fala à miúda mas fá-la bem
Fala ao teu pai mas ouve a tua mãe
Fala francês fala béu-béu
Fala fininho e fala grosso
Desentulha a garganta levanta o pescoço
Fala como se falar fosse andar
Fala com elegância - muito e devagar.
A Meu Favor
A meu favor
Tenho o verde secreto dos teus olhos
Algumas palavras de ódio algumas palavras de amor
O tapete que vai partir para o infinito
Esta noite ou uma noite qualquer
A meu favor
As paredes que insultam devagar
Certo refúgio acima do murmúrio
Que da vida corrente teime em vir
O barco escondido pela folhagem
Má consciência
O adjectivo
Dá-me de comer.
Se não for a ele
O que houvera de ser?
Vivo de acrescentar às coisas
O que elas não são.
Mas é por cálculo,
Não por ilusão.
À maneira de Benamor Lopes
A vida não é de abrolhos.
É de abr’olhos
A vida não é de escolhos
É de escolhas.
Por que me olhas e m’olhas?
Por que me forras a alma
Com o relento de um sentimento?
Serei eu a tua escolha?
Abre os olhos e olha,
Canção
Que saia a última estrela
Da avareza da noite
E a esperança venha arder
Venha arder em nosso peito
E saiam também os rios
Da paciência da terra
É no mar que a aventura
Tem as margens que merece
E saiam todos os sóis
Que apodrecem no céu
Dos que não quiseram ver
- mas que saiam de joelhos
E das mãos que saiam gestos
De pura transformação
Entre o real e o sonho
Seremos nós a vertigem
Amigo
«Amigo» é a solidão derrotada!
Redacção
O melhor pretexto É tão frágil a vida, tão efémero, tudo! (Não é verdade, amiga, olhinhos-cor-de-musgo ?) E ao mesmo tempo é forte, forte da veleidade, de resistir à morte quanto maior a idade. Assim, aos trinta e sete, fechados alguns ciclos, a vida ainda pede mais sentimento, vínculos. Não tanto os que nos deram a fúria de viver, como esses descobertos depois de se saber Que a vida não é outra senão a que fazemos (e a vida é uma só, pois jamais voltaremos). Partidários da vida, melhor: do que está vivo, digamos "não!" a tudo que tenha outro sentido. E que melhor pretexto (quem o saiba que o diga!) teremos p'ra viver senão a própria vida?
Há palavras que nos beijam
Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperança louca.
Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.
De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.
(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)
Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes